31.3.09

Espelho, espelho meu...

Na última semana tosei a cabeleira, que estava longuésima, até pouco abaixo dos ombros. Teimosia pura (o modelo é recorrente, quando eu RESOLVO cortar o cabelo), já que este corte exige certa habilidade no manejo da escova, para que as pontinhas fiquem voltadas para fora, exibidas. A moça aqui, no entanto, que até se esforça para aperfeiçoar suas habilidades domésticas, é um zero a esquerda quando se trata de auto-cuidado pessoal. Não sei escovar, não tenho chapinha, não faço as unhas nem em caso de emergência e não sei lidar com a pinça - Claudinho é quem me salva todos os meses para que a borboleta aqui não vire taturana.
Já disse em outras ocasiões que nasci para ser rica - o que, unfortunatelly, não aconteceu (mas bóra tentando...). Porque para ficar minimamente apresentável preciso da assessoria integral de cabeleireiras, manicures, maquiadoras, fazedores de sobrança, sou uma completa incapaz (sei passar perfume, vale?).
Todo este enorme preâmbulo para ressaltar a que ponto vai a vaidade de algumas mulheres (mulheres comuns, não vamos fazer referência às biônicas que moram em clínicas de estética, aka Angela Bismarchi). Claaaaro que é legal estar sempre bonitinha, na adolescência eu acordava um tantinho mais cedo para acertar no "book" (para os não iniciados, topete preso com passadeirinha, moda nos 90's). Mas certas coisas beiram o ridículo: 7h30 da manhã de uma terça-feira, um calor tropico-infernal, e, no banheiro do shopping que acomoda minha academia e um colégio, duas adolescentes deslizavam cuidadosamente a chapinha pelos cabelos (mal) pintados de vermelho - e cada uma com a sua prancha de estimação, não tem esta de repartir não.
Pior que isso só a moreninha de 38 quilos da academia (já falei dela, está cada vez mais magra), que, antes de suar a bacurinha em bicas pedalando a ergométrica e saltitando no jump, alisa os vários cachinhos um por um com a chapinha que carrega permanentemente na mochila.


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Ontem lavei os cabelos e fui dormir com eles molhados. Deu uma pregui de pegar no secador...

25.3.09

De melissa a crocs

Nasci e fui criada numa cidade onde diversidade de estilos nunca foi marca registrada. Meninos podiam ser mauricinhos - babylook (sim, na minha época babylook não era patrimônio gay) e calças de sarja coloridas, do amarelinho canário ao vermelho cardeal.

Ou podiam ser "largadões" - ostentando o maldito triunvirato boné, bermudão-quase-calça e correntes no pescoço. Sendo que, com o passar dos anos, estes adereços foram ganhando peso. Bonés ganharam o capuz do moleton por cima. Calças e bermudas, bolsos e passamanarias suficientes para deixarem meio rabo do sujeito à mostra. Correntes de pescoço passaram a ser adquiridas nas docas.

Meninas variavam ainda menos. Havia as patricinhas e as patricinhas wannabe. As primeiras, poucas, usavam roupinhas transadas e caras das boutiques de Shark. As outras contentavam-se em imitar as riquinhas comprando peças similares nos outlets de BR que abundam na região.

O básico: camisetinha (barriga à mostra), mini jeans e mega plataformas. É assim até hoje, mas as saias perderam terreno para o famigerado legging.

Eu me achava de vanguarda (hahahaha). Eu e Lô, que não me deixa mentir. Guiadas pela bíblia das teenagers dos anos 90, a revista Capricho, cismamos de ressuscitar a sandália Melissa. E fomos encontrá-la, aquele modelinho retrô, baixinha, em um único lugar da cidade, o Mercadão Público - devo observar que o mercado público de Shark não é semelhante a tantos MP existentes no país, cheios de vida, música, chopp gelado e peixinho frito. Ah, nem queira saber...

O look era o "máximo": jeans, camisetinha branca comprada em loja de criança (tinha que ser pequena) e a Melissa - muitas vezes usada com meia - nos pés.

É foda morar na roça. Olhares horrorizados nos devastavam por onde andássemos. Mas, seis meses depois (ou um ano?), todas as meninas haviam adotado as sandalinhas de plástico - ainda que muitas delas na versão "tropicaliente", com um saltão medonho de juta falsa.



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Hoje devo admitir que, de maneira geral, o povo de Shark e adjacências já manda muito melhor no figurino. O que a globalização não faz, não é mesmo, minha gente? Arriscam mais, brincam mais, coordenam peças com mais ousadia e, com frequência, acabam acertando.

É que hoje, além das "patricinhas" (termo em desuso, mas não achei substituto), dos "playboyzinhos", dos riponguinhos e dos pagode stylers (help!), temos que conviver com os (pseudo) emos. Pseudo porque certamente nenhum deles conhece ou segue a "causa" emo - se é que emos têm causa (hahahahahah, morri!) a não ser usar franjão e lápis no olho e parecer melancólico (é lógico que ser "emo" é a desculpa adolescente para sair do armário, mas não vem ao caso).

Aí que, dia desses, circulando pela cosmopolita Marcolino Cabral, cruzo com uma criatura ímpar. Franjão, lapisinho no olho (mas bem de leve, era dia), camiseta com estampa descolada, jeans e, nos pés, crocs. Laranjas. O proprietário do look era um menino, deixo claro. Na hora tive ímpetos de me atirar ao chão e rolar de rir, ninguém merece croc. Muito menos laranja. Mas depois lembrei-me de mim e Lô aos 16, exibindo, nos pés, o que meio mundo deveria considerar "esquisitos trecos de plástico". Aí fiquei comovida com o esforço fashion do moçoilo - é bem possível que daqui a alguns meses surja uma horda de teens batendo crocs coloridas pelas calçadas de nossa big city.

Eu comprei uma destas pra minha sobrinha. Branca, da Hello Kitty. A menina tem sete anos, mas já acha meio cafona.

23.3.09

Tópicos típicos

  • Eu definitivamente prefiro o inverno. Principalmente se alojada neste Sul catarina do meu coração (hohoho). Porque o Sol é massa, calorzinho é gostoso, verão é bonito de se ver, mas nada mais civilizado do que um termômetro indicando menos de 18 graus.
    Porque temos as roupas bonitas. E os cachecóis. As botas. E tem as comfort foods. Né?, porque, fala sério, salada é saudável, sorvete é tudo, mas uma sopinha fervilhando num dia frio de trincar os ossos é muito reconfortante. E vinho.
  • O que é você sustentar bem uma montação, não é mesmo? Assistindo a episódios de Sex and the City no Fox Life, sempre me surpreendo com Carrie Bradshaw. Sempre. Porque ela carrega dignidade de qualquer jeito, seja usando um tubinho preto de jersey ou um trapo furado e esfarrapado. Mesmo que este trapo esfarrapado for Roberto Cavalli. A roupa era tão feia, a Sarah Jessica Parker é o cão chupando manga, mas, ah, reles mortais... o conjunto da obra é sempre fantástico. Estilo: ou você tem ou você não tem. Seja com Roberto Cavalli esfarrapado ou com regatinha de R$ 9,99 da Renner.
  • Preferia ter lido algo a respeito de Watchmen antes de assistir sua versão para o cinema - até porque viajei horrores nos primeiro 30 minutos. Aí depois foi esquentando - principalmente quando Dr. Manhattan aparecia como veio ao mundo - só que azulzinho. Sim, taradas (os) de plantão, Watchmen tem nu frontal masculino! Ainda não é o suficiente para conduzi-lo ao cinema? Ok, é um bom filme de ação (bons efeitos, mocinhos vilões, zzzz...).
  • Você sabe que tem tudo para recuperar aqueles quilos que custosamente perdeu quando já se enche da academia na primeira semana... Anyway, não quero nada de Páscoa mesmo... nada comível, deixo claro. Um sapato luxo com salto de cone invertido iria bem...
  • A velhice chega para todos, não há como escapar. Mas para Shannon Doherty ela foi mais cruel. Vide a velha e boa (?) Brenda Walsh, na nova versão de Beverly Hills 90201. Com direito a queixo duplo e tudo.
  • E que venha o inverno. Que eu tô louca pra usar meu casaqueto vermelho.
  • Eu já contei que quase me afoguei no rafting? (dããããã...)

18.3.09

Miguelito, o anti-arcanjo

Ele já chegou causando. Nem havia pisado na empresa e já provocava polêmica. Foi só dar uma olhadela básica no currículo extraordinário do moço para um funcionário mais esperto já apontar: picareta. Mas os chefes preferiram não concordar com o pré-conceito. E contrataram a polêmica criatura. Por mais de um ano, Pablo Miguelito "La Garantía Soy Yo" Herrera divertiu seus colegas de trabalho com as mais bizarras situações.
Para ele não havia tempo ruim. Qualquer terça-feira era boa para reunir a galera em suas luxuosas dependências, onde oferecia cerveja gelada, uísque importado, paella, tacos, guacamole e doses generosas dos produtos colombianos "tipo exportação". A vida era uma bela e colorida festa.
No Carnaval, marcou época em Shark city ao desfilar abraçado a sete vampiras traficantes lésbicas. Na campanha eleitoral, encheu a burra de money, money, money vendendo a alma a Deus, ao diabo, anjos, santos, íncubos, súcubos e quem mais se interessasse. Mas não votou: seu título é de Pedro Juan Caballero.
Virou figurinha fácil em lojas de móveis e eletrodomésticos, redecorando seu flat com o típico bom gosto paraguajo. LCD de 49 polegas, sofás de couro, chaise de camurça fina, tapetes, cortinas, esculturas. Obras de arte das mais variadas, luxo e ostentação.
Aos que o visitavam em suas dependências, tudo. Filés de linguado, camarões gigantes na manteiga, lagosta ao termidor, prosecco geladíssimo. E entre garfadas de risoto de açafrão e golinhos de vinho, estalava a linguinha marota e exibia fotos de sua intimidade com a adorável esposa. "Numa delas a bichinha abocanhava até o talo. Depois tentaram dizer que era um brinquedinho de borracha, mas, ah, meu bem, de pau eu entendo", revela D., testemunha das orgias gastro-sexuais de Miguelito.
Se com a esposa o sexo parecia tão ardente, sem ela o panorama era de filme pornô. Bastava a bichinha ir embora visitar familiares distantes e era aquele desfile de criaturas-que-fazem-da-calçada-local-de-trabalho.
Os vizinhos, na (vã) tentativa de preservar a moral e os bons costumes, pediam para que ele não posasse tão ostensivamente, nu, balagandãs à mostra, apalpando coxas, bundas e peitos, em frente à janela com vista para o playground, às 11 da manhã. Para sua fúria, que jamais permitiu ser cerceado em suas vontades.
Só muito tempo depois foi que perceberam o rombo. Tentaram interceptá-lo, mas não houve tempo hábil. Háhá, amadores...
No meio da madrugada Miguelito evaporou com todos os seus recém-adquiridos pertences não-pagos. E dívidas, muitas. No rent-a-car, na Fatia de Baguete, lanchonete de Shark, na rotisserie, na locadora, na padaria, imobiliária... enfim, ainda gastou a última gota de sua lábia invejável para levar, na faixa, um equipamento fotográfico de última geração.
Pânico em Shark city.
A polícia foi acionada, autoridades comunicadas, mas já era tarde. Na parede do apartamento vazio, um recado desaforado dirigido a todos os seus "desafetos" - e escrito com o conteúdo da uma fralda bem cheia da filha mais nova...

10.3.09

Little black underpant

Quem trabalha ou já trabalhou em uma redação (de jornal, de TV, rádio, blog, portal de notícias, whatever) sabe o quanto pode ser divertido e proveitoso lidar com agências e assessorias de imprensa diversas. Primeiro porque, obviamente, estes profissionais podem realmente te quebrar os maiores galhões ever nos conturbados horários de fechamento.
Segundo - e aí reside a magia - porque eventualmente você recebe pérolas como esta abaixo, que me foi enviada por um povo amigo que trabalha na portentosa press sharkcitiana.

Uma agência (do Rio) enviou, como sugestão de pauta, um pacote onde relaciona o hit "Você não vale nada (?????)" com uma personagem da novela O Clon... ops, Caminho das Índias. Coitadinha da Dira Paes, que figura como protagonista no meio dessa cafonice... Sente o drama (as observações em itálico, entre parênteses, não vieram no release, evidentemente):

Melô da boa: Forró 'Você Não Vale Nada', tema de personagem de Dira Paes, é o maior sucesso da novela 'Caminho das Índias'!!! (as exclamações são luxo e alegoria)
'Você não vale nada mas eu gosto de você!' Toda vez que Norminha (Dira Paes) aparece em 'Caminho das Índias', o forró cantado pela banda Calcinha Preta (yep!) marca os olhares e o requebrado da fogosa mulher do guarda Abel (Anderson Muller). Nem a exótica abertura da novela de Glória Perez faz tanto sucesso com o público. É um sucesso entre as mulheres.
A Agência XXX oferece esta matéria especial composta por texto e imagens, no valor de: R$ 120,00 (caí pra trás: não é que eles COBRAM por isso?).
Mas o mais impressionante ficou pro final. Junto do release, algumas fotinhos como "aperitivo" (tipo, o ovo colorido que antecede o banquete de coxinha com molho farrapo). Além da imagem de Dira Paes e do marido "guarda" (hahahahah, guarda...), três criaturas que se denominam os integrantes do Calcinha Preta. Vamos a elas?
Essa é a basiquinha da turma. Peitinho murcho, mas com dignidade, macacãozinho fiiiino de risca-de-giz e cintão branco adornando a cinturita de pilão. Gamei na franjinha estrategicamente cobrindo meia testa. E o relógio?

...
Nem sei o que dizer. Tipo, sei lá, meio que virou tendência o cara se bandear pro seu salão de beleza (ou instituto, ou coiffeur) predileto e pedir pela escova progressiva amiga. Mas esse aí passou do padrão Charlotte Belzebu e exagerou no formol. Exagerou pesado. E isso que devemos considerar sua descendência tupi-guarani, que mesmo sem chapinha já lhe garantiria fios ultra-lisos. Pra que tanto?


Heheheh... mas isso é Brasil, meu povo! Olha o piRci no umbiguinho! Olha o macacãozinho sedutoramente aberto até o púbis! Olha o franjão! Ela deve frequentar o mesmo saloon onde seu colega de banda faz a progressiva.
Não é uma delícia abrir seu email DO TRABALHO e se deparar com uma pérola destas? É o que eu digo, jornalistas são os que mais se divertem...

Fio-terra

Bom demais para ser verdade... após meses de paz e tranquilidade sem a presença do meliante pós-adolescente que reside logo embaixo de meu flat, eis que a criatura volta mostrando a que veio. Relembrando: o menino e a mãe viviam às turras, brigas violentas every day. Até que o filhote chutou o balde e bandeou-se, mala e cuia, para casa de papá, em terras gaúchas. Para desespero de sua mãe e minha alegria, que já não aguentava tantos berros, uivos e gemidos. Aliás, os gemidos continuaram, em outra escala, dada a profissão de minha cara vizinha...
Pois bem, volta o menino e, desta vez, acompanhado por uma garota, a namorada. Aí que, noite de sábado, a mãe provavelmente "trabalhando duro" no Little Castle, e o rala-e-rola dos mais calientes pôde ser ouvido em minhas dependências. Dos mais calientes vírgula, porque sexo adolescente - ainda que pós-adolescente - me soa tão aflito, angustiado, tão ejaculação precoce que eu relembrei porque é bom ser adulta e se relacionar com seres adultos.
Aí foram aqueles ruídos sôfregos, nervosos, grunhidos de ambas as partes, uma coisa gutural. E os tapas... Ah, minha gente, era schlep daqui, schlep dali, uma espancação hard core. Fiquei alerta pensando que o bruto estaria machucando a pobre menininha, mas, qual!, de repente escuto a voz dele, abafada, implorando para que ela pegasse mais leve: "Devagar aí!", dizia o garoto, pedindo água. A menina gargalhava, perversazinha.
Uns dez minutos de esfregação e gozo depois, e o silêncio. Pensei que minha experiência sexual auditiva tinha chego ao fim quando escuto o menino pedindo mais. Ela recusa, regateia, faz beicinho. Aí o guri fecha com chave de ouro: "Se tu não queres mais, então tira o dedo do meu cu!".

Humpf... já não se fazem adolescentes românticos como antigamente...

3.3.09

BBB



Nossa... esta eu não perco de jeito nenhum. É, já ultrapassei a barreira da vergoinha por estar acompanhando o BBB. E para os iniciados: continuo meio que fã da catarina retardada, mas o Ralf não é nada mais do que a versão carolinística de calças. Ou sunga branca, whatever.
Update: Peninha do Ralf... mas bem-feito pra vaca da Milena e pro (semi) enrustido do Flávio. Nojentos. (você descobre que chegou ao fim da linha em matéria de reality shows quando sabe os nomes dos participantes de cor).

1.3.09

Mitômana

Ela já chegou chamando atenção - não por ser terrivelmente feia nem por radiantemente bela, mas por falar alto. Só alto não, praticamente aos berros, uma coisa horrorosa. Estavamos embarcando no bus em POA, rumo a Sharkcity, e os agudos (mais graves que agudos, devo admitir) da rapariga fizeram com que eu desviasse os olhos das palavras cruzadas um bocado de vezes, ao longo do trajeto.

Juro que ainda tentei seguir indiferente, mas percebi que todo o blablablá e a postura overreacting da gritona poderiam me render horas de puro deleite. Pois bem.

Mal se acomodou em sua poltrona e a mulherzinha vociferou para sua partner de viagem: "Vim a trabalho. Trabalho em Porto Alegre mas tenho casa em Garopaba, aí já viu, né? Tive que vir, tinha um monte de projetinho atrasado. Mas deixei minha filhota com a avó. Coisa booooa, né? Ter alguém pra cuidar da filhona assim...". Estranhei o tom de "gabância" do comentário. Casa em Garopaba, a meca litorânea dos gaúchos, muitos projetos, sinal de dinheiro entrando... decidi continuar bem atenta.

Quando ela comunicou, em seguida, que preferiu não vir com seu automóvel (um Omega GLS), resolvi analisar o visú da gata. Camiseta do time do (meu) marido (no Rio Grande do Sul simpatizei com o Grêmio, justificou), daquelas encontradas penduradas em série na barraca do camelô; jeans "corsário" (afff) e sandálias de salto colossal de madeira, cobertas com camurça puída; bolsa adquirida, provavelmente, no mesmo lugar onde encontrou a camiseta. E as bagagens, inúmeras, socadas com força na parte superior de sua poltrona, entre bolsões sintéticos e gigantescas sacolas plásticas repletas de badulaques. Foi quando desconfiei da incapacidade da menina de falar a verdade.

Ela mentia, juro que mentia. Mas mentia com tanto orgulho e sinceridade que certamente levava sua interlocutora a acreditar. Contou dos projetos que desenvolveria (móveis de mdf); da filha liiinda de enormes olhos verdes; das belezas, atrações e deficiências de TODAS as cidades por onde passávamos. Ah, fala sério, ninguém sabe nada de Maquiné a não ser que lá tem um restaurante de beira de estrada que vende bala de banana. De Sharkcity, ela fez apenas comentários supérfluos, en passant.

Cansei de tanta lorota e abstraí por algumas horas. Na paradinha para um xixi básico, mais mitomania. "Agora a gente pára aqui pra comer um sanduíche natural e um chocolate quente", instruia ela, exatamente o lanche eleito pelo inconsciente popular coletivo como sendo "fino", hahaha, não sei de onde saem estas coisas. Um calorão fdp e a guria foi seca no "chocolate quente" (nescau), pose é tudo neste mundo.

Só fui me deter na criaturinha novamente pouco antes de desembarcarmos. Havia despirocado. Marcava um encontro com sua companheira de viagem, levaria a linda filha de olhos verdes para conhecê-la. Disse que havia retornado, há pouco, de Buenos Aires, e que já se programava para fazer um tour ligeiro pelo Uruguai (adoro fazer compras lá). Também falou da possibilidade de um cruzeiro, teria amigos em Fernando de Noronha, para onde costumava ir com regularidade.

Não ouvi o motivo de ela ter desembarcado em Shark, já que, originalmente, seu destino era Garopaba. Ainda antes de descer, perguntou para as paredes (ou janelas da Santo Anjo) se seria melhor ligar e pedir para a família vir buscá-la ou chamar um táxi. Optou por ligar.

No orelhão, telefonou a cobrar e convenceu alguém a vir buscá-la alertando para os diversos presentes que havia trazido (imagino que acondicionados na sacolona de plástico paraguaia). Percebi certa relutância do outro lado da linha, já que chovia, mas como tinha presentes na jogada, em pouco mais de dez minutos uma humilde senhora, pilotando uma bicicleta, com uma menininha encardida na garupa, chegou para receber nossa protagonista. A rapidez teve explicação óbvia: quem conhece a geografia de Shark, sabe que a localidade de Capão Cagado fica logo ali atrás da rodô.