12.1.09

Velhos hábitos (ou O Menino e os ossinhos)

Quando iniciamos este humilde bloguinho, eu e Stellita, imaginamos que, para que a idéia funcionasse de fato deveríamos postar diariamente, várias vezes ao dia, se possível. No início a coisa fluiu bem, mas com o passar dos meses minha disposição foi se reduzindo e os assuntos, escasseando (assuntos nunca escasseiam, mas é a desculpa mais compreensível, vinda de um blogueiro).
Outro problema era o meu acesso precário à net. Logo no início deste ano, quando finalmente conquistei o status on line sem restrições, calculei que finalmente o As Imediatas seria bombardeado por postagens múltiplas. Ledo engano. Bastava sentar em frente ao computador para invocar o mal-afamado "bloqueio" de escritor. Nada, branco, vazio, oco, no máximo algumas idéias esparsas que caberiam muito bem em um rascunho.
Hoje dispus-me em frente a TV e, casualmente, enxerguei meu caderninho (um dos vários que mantenho, atirados por todos os cômodos da casa). Imediatamente diversas idéias tomaram forma e foi só pegar na caneta para sair escrevendo postagens que estavam encalhadas em alguma gavetinha do cérebro.
Lembrei-me de quando acompanhava o programa dominical Fantástico - durante a infância, a família se reunia na sala de TV para assistir às reportagens especiais, era meio que sagrado esta confraternização silenciosa (porque o pai não permitia um mísero pio que desviasse sua atenção).
Uma reportagem marcou-me sobremaneira. Um repórter visitou o sertão nordestino para mostrar a vida de algumas famílias miseravelmente pobres, sem comida, sem água, sem qualquer infra-estrutura que lhes oferecesse dignidade. Mas sobreviviam, com trabalho duro, com suor e lágrimas, às duras penas.
Um menino comovou o repórter: quando não estava trabalhando com o pai (em plantações de cana ou cavando poços artesianos), ele, que deveria ter uns oito anos, divertia-se com seus brinquedinhos feitos em casa, nada mais do que pedaços de ossos de animais precariamente moldados em formatos que a imaginação da criança garantia serem carrinhos e bonequinhos.
Emocionado, o jovem jornalista retornou à cidade e lá comprou um super presente para o menino sertanejo, entregando-o nas mãos do mesmo: um autorama dos mais modernos, o equivalente a um Playstation, nos dias de hoje.
Qual não foi a surpresa do repórter ao retornar à casa da criança, semanas depois? Sentadinho no batente da porta, o menino não fazia nada diferente do que anteriormente. Brincava animado com seus pedacinhos de osso. Sobre o guarda-roupa quebrado da família repousava, quase que intocada, a caixa do autorama.
Não se tratava de pouco caso com o presente, mas o brinquedo novo era tão suntuoso, tão bonito, colorido, que trouxe preocupação a todos os membros da família. E se quebrasse? Melhor seria não mexer. Sendo assim, o menino voltou, resignado, para seus carrinhos de ossos. O repórter chorou (minha mãe também).
Neste momento quis ser repórter também, igual ao moço generoso da Globo, para conhecer universos totalmente díspares do meu, para ter contato com as mais diferentes personalidades, para constatar quão grande é este mundão, e para descobrir o quanto é difícil modificar velhos hábitos. Sei que posso fazer mais por mim e pelo blog com meus bloquinhos em punho. Subitamente, me enxeguei no menino dos ossinhos. Em breve, mais postagens (agora é sério).

3 comentários:

Guilherme Correa disse...

Mesmo o fantástico não sendo aquela maravilha, ainda paramos em frente a tv para assisti-lo. Como sempre, o blog está ótimo. Leitura obrigatória ao navegar pela net. BJãoooo CT :D :D :D

Lora W. disse...

Oi guria!! como foi de fim de ano?
nossa, lendo esse texto voltei pro passado geral... lembrei do tempo que morava aí e imaginei tu, neidé, deba, lane e seu jaime sentados no sofá! nossa, senti uma saudade profunda. Tempo que não volta mais... infelizmente!
Beijos.

Anônimo disse...

Lembro exatamente dessa reportagem - comovente. Também me marcou muito.