Baseado em fatos reais:
Por algum motivo ainda desconhecido da humanidade, acreditamos piamente que as mazelas sofridas pelos outros jamais irão bater em nossas portas - até o dia em que batem. Acidentes bizarros, confusões absurdas, dramalhões mexicanos, grandes problemas familiares, tudo parece muito distante de nossas pacatas realidades quando nos encontramos na função de meros expectadores.
Alceu acompanhava, indignado, os noticiários da TV, onde a podridão da sociedade é cruelmente dissecada, todos os dias. Jamais imaginou que um revés digno de Manoel Carlos se abateria sobre sua vida. Bem casado, Alceu julgava ser uma pessoa desmedidamente feliz. Para espantar os momentos de solidão longe da amada - o casal, modernamente, vive em casas separadas - o rapaz teve a infeliz idéia de circular por determinados ambientes virtuais que lhe proporcionassem certo amparo sentimental.
Foi quando conheceu Danielle B. A moça, carente e solitária, eternamente à procura de um grande amor, contou passar seus dias entre a fábrica onde ocupava um importante cargo de engenheira e sua casa, onde morava com sua mamã. Curiosamente, a pobreza de vocabulário e a estreiteza das idéias não provocaram desconfiança a Alceu.
Da sala de bate-papo a amizade migrou para endereços de e-mail e de conversas instantâneas mais privadas. Quando deu por si, o rapaz já havia se habituado ao frescor de uma conversa descompromissada em meio ao seu turbulento ritmo de vida; habituou-se à bajulação da admiradora à distância, sempre tão solícita, disponível, compreensiva e carinhosa. Seu ego e sua auto-estima foram parar nas alturas e até o relacionamento com a esposa, sempre tão tranqüilo, tornou-se subitamente mais picante e passional.
"Certo dia ela me contou que faria uma delicada cirurgia de períneo. Deu detalhes, revelou que sofria com incontinência urinária e que sempre sonhara em acordar limpinha e seca em sua cama. Disse que também iria aproveitar a intervenção cirúrgica para cauterizar algumas verrugas genitais, coisinha básica. No dia da cirurgia, mandei mensagem desejando boa sorte. Logo depois, enquanto resolvia importantes questões de trabalho, na firma, recebo uma ligação dela. O céu desabou", relata Alceu, o idiota.
Danielle - se é que ainda podemos chamá-la assim - parecia outra. Não mais a moça inexperiente de antes. Uma outra mulher, de língua ferina e vocabulário (ainda mais) chulo. Revelou não se chamar Danielle B., não trabalhar em fábricas paulistas, não ser engenheira, não nada. Contou uma história maluca onde teria sido muito bem paga para fisgar o otário do Alceu e levantar o máximo de material possível - entre e-mails, conversas de messenger e telefonemas - que comprovassem o menor indício de infidelidade da parte do gajo. O plano maligno visava chantagem.
"Meu trabalho aqui já foi feito, encomendado por uma pessoa que te odeia muito e que quer destruir o teu casamento" (sim, foram estas as palavras usadas pela golpista, e não apenas um recurso literário piegas). "Fiquei tão nervoso que, se fosse mulher, minha menstruação teria descido na mesma hora", contou Alceu aos amigos, depois.
Drama maior foi contar toda a travessura para sua tão amada esposa - antes mesmo que esta descobrisse por outras vias. Tudo foi resolvido e o casal, felizmente, voltou às boas.
Alceu abandonou de vez a internet - hoje só a usa para trabalhar.
E Danielle B.? Esta, enquanto trata de suas verrugas genitais - este ponto, de acordo com a mesma, era o único verdadeiro - está sendo cuidadosamente vigiada. Por enquanto, à distância. We´re watching you, Danny girl...
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