Vamos começar uma série aqui no blog As Imediatas com temas que mostram a importância das mulheres em vários segmentos da nossa sociedade. Vamos começar pelas artes, área que tem uma grande dívida com mulheres como Georgina Alburquerque. Ela foi pioneira em várias atividades artísticas, mas passa despercebida pela história apenas pelo fato de ser do sexo feminino. Quem nos apresenta esta personalidade é a especialista em História da Arte, Elisa Silva. Boa leitura!
Georgina
Albuquerque: A Pioneira
Nascida
em Taubaté, Georgina (1885-1962) começou a estudar artes com quinze anos, seu
primeiro professor foi o italiano Rosalbino Santoro, quando mudou-se para o Rio
de Janeiro foi estudar na ENBA (Escola Nacional de Belas Artes) com Henrique
Bernardelli.
Nossa
artista casou-se em 1906 com Lucílio de Albuquerque com quem dividiu a vida e a
carreira, na medida em que ele também era pintor. Lucílio ganhou o prêmio
viagem para estudar artes em Paris, então o jovem casal parte para cidade-luz visando
concluir seus estudos. Chegando lá Georgina é aprovada em 4º lugar na École Nationale Supérieure des Beaux-Arts,
sendo a primeira mulher brasileira a ingressar nesta importante escola, ao
mesmo tempo em que frequenta aulas livres no estúdio Julian. Infelizmente, não
há registro da sua passagem pelo estúdio Julian, pois os arquivos de ateliês
femininos não eram preservados.
Em
Paris foi influenciada pela pintura impressionista e, além das pinceladas
grandes e soltas, adota uma paleta de cores claras e vibrantes, tal qual os
impressionistas europeus. Essa técnica acompanha a artista por toda sua
carreira, porém a paleta de cores com o passar do tempo se torna mais escura.
De
volta ao Brasil, em 1911, faz sua primeira exposição em nome próprio e a partir
deste ponto passa a expor regularmente na exposição geral de belas artes. Antes
já tinha exposto seus trabalhos em outras oportunidades, mas como aluna, o que
equivale dizer que as conquistas eram atribuídas aos mestres e muitas vezes os
nomes das artistas mulheres nem mesmo apareciam.
Após
a morte do marido em 1940, Georgina funda em sua casa o museu Lucílio Albuquerque,
tornando-se pioneira no ensino de desenho e pintura para crianças. Além disso,
passa a dar aulas na ENBA (Escola Nacional de Belas Artes) primeiro como
livre-docente, depois como catedrática-interina e, em 1952, torna-se a primeira
diretora mulher da ENBA.
Ela
também foi a primeira mulher a participar de um júri de pintura, o que
consolidou sua posição dentro da academia, seus feitos institucionais são
formidáveis, mas o brilhantismo da sua carreira não se limita apenas as
questões acadêmicas, sua temática foi inovadora e quebrou paradigmas, pois ela
foi a primeira mulher a se aventurar na pintura histórica nacional, área até
então exclusivamente masculina.
Em
1922, como parte das comemorações do centenário da independência, Georgina
expôs o quadro chamado Sessão do Conselho de Estado, que representa a
proclamação da independência como um evento diplomático, cuja personagem
principal é a Imperatriz Maria Leopoldina da Áustria.
A
cena representada por Georgina é absolutamente diferente dos outros quadros
sobre a proclamação da independência, os quais representam cenas de batalhas e
um viril D. Pedro I, como podemos ver na pintura do mesmo tema de Pedro Américo,
por exemplo. Considerando que a proclamação da independência foi um processo
cujas negociações foram de 1821 até 1825, a cena representada por Georgina tem
muito mais fundamento histórico do que o quadro de Pedro Américo, apesar de que
essa obra é um primor do ponto de vista técnico.
A
cena que outorga o protagonismo histórico a Imperatriz Maria Leopoldina não
poderia ser concebida em um momento mais oportuno, o ano de 1922 foi marcado
pela luta feminina pelo direito ao voto. Neste ano também aconteceu o 1º
congresso feminista organizado por Bertha Lutz e a fundação da Federação
Brasileira do Progresso Feminino, instituição cujo objetivo era lutar pelos
direitos civis e políticos das mulheres.
A
autora Ana Paula Cavalcanti Simioni chama atenção ao fato de que a obra de
Georgina de Albuquerque surge em um momento histórico-social no qual as
mulheres que desejavam seguir a carreira artística enfrentavam dificuldades de
gênero. Isso se devia ao caráter excludente do sistema acadêmico, que impedia
alunas de frequentarem aulas de desenho e estudo do nu artístico, fase
fundamental para a formação da carreira do artista.
Dentro
desse contexto, Vicentis defende que a composição de Sessão do Conselho de Estado oferece
respaldo à luta feminista pelo reconhecimento do direito da mulher ao voto e à
cidadania plena ao retratar, pela primeira vez, uma mulher decidindo os rumos
da política do Brasil.
Assim,
o quadro não é apenas uma alternativa histórica a cena da proclamação da
independência tradicional, ele quebra paradigmas e chama a atenção para
importância da mulher na sociedade.
Georgina
Albuquerque foi uma grande artista, uma professora de artes renomada, pioneira
em vários sentidos e uma mulher fantástica, muitos artistas brasileiros não
colecionam os feitos desta notável pintora. Contudo, o papel a ela atribuído
nos livros de artes é de impressionista brasileira, sem a notoriedade que
muitos artistas inferiores a ela receberam pelo simples fato de serem homens.
Elisa Silva, especialista em
História da Arte e autora dos livros Paris - Sonho Meu e Paris - uma viagem
impressionista
GEORGINA
de Albuquerque. In: ENCICLOPÉDIA Itaú Cultural de Arte e Cultura Brasileiras.
São Paulo: Itaú Cultural, 2021. Disponível em:
<http://enciclopedia.itaucultural.org.br/pessoa21325/georgina-de-albuquerque>.
Acesso em: 04 de Abr. 2021. Verbete da Enciclopédia.
ISBN: 978-85-7979-060-7