5.11.10

Assalto frustrado

A noite estava agradável, propícia para aquele pulinho ao restaurante/bar/boate mais próximo. O clima de guerrilha provocado pelas eleições havia arrefecido, todo mundo só pensava mesmo em se jogar na cerveja gelada e papear gostosamente com os amigos. Chegamos à pizzaria, eu e a família do meu homem (hahahahhahah, eu tento parecer séria, mas me dá engulhos só de escrever "meu homem", que coisa cafona...) e pedimos uma rodadinha básica, com coca-cola zero que é pra manter a cinturinha de buj... quer dizer, de pilão.
Conversa vai, conversa vem, planos sonhadores para a viagem que se aproxima, sonzinho rolando bacana, o sogro até arrisca cantarolar junto com o crooner: "...nosso apartamento... um pedaço de saigon-on-on".
Eu estava sentada bem no fundo do restaurante, de costas para a entrada. E só percebi certa movimentação quando todos os olhos já se fixavam em uma criatura com uma camiseta enrolada na cabeça, caminhando, decidido, rumo ao caixa do estabelecimento. "É um assalto", o namorado solicitamente me informou, e eu já jurando que era uma performance teatral daquelas, cujos atores fazem três piruetas e duas falas, ninguém dá bola, e depois vêm pedir dinheiro na sua mesa.
Não consegui entender direito, quando me virei pra acompanhar o movimento o garoto já saia porta afora. Ficava difícil acreditar no potencial marginalístico do gurizinho, que não devia ter mais que 16 anos, dava vontade de estapear a cabeça e mandar ir dormir sem tomar nescauzinho.
Mas você manja só o perfil pacífico da cidade (que de pacífica não tem mta coisa, já fui assaltada a mão armada DUAS vezes em Shark city, e homicídios pululam por aí). Quer dizer, pacífico é o perfil dos moradores de Shark, não habituados com situações como estas. Geral simplesmente ficou cantarolando Emílio Santiago, mordiscando suas bordas de cheddar e nem tchuns pro piá (na verdade, eram dois meninos, eu tive a incrível capacidade de não ver o segundo indivíduo).
E o que rolou é que o assalto simplesmente NÃO ACONTECEU. Yeah. Os delinquentes foram solenemente ignorados e acharam de bom tom dar no pé antes que alguém os deixasse de castigo, ajoelhados no milho.
Até chegaram a chamar a polícia, e tals, só pra fingirmos, coletivamente, que tinha sido algo relevante. E poderia: dizem que um dos garotos estava armado, mostrou o brinquedinho pra quem quisesse ver - nada muito diferente do que uma pistolinha de 1,99.
Poderia ter dado bem certo (se o som estivesse mais baixo, talvez todos tivéssemos escutado o "é um assalto" da dupla). Caso o pânico se instaurasse, os guris levariam uma boa soma pra casa - pensa no conteúdo de umas 50 bolsas e umas 50 carteiras, no mínimo, fora a soma do caixa? Mas eles calcularam mal. Entraram com rosto coberto, tentaram intimidar com a pistolinha de plástico mas... a camiseta. A camiseta enrolada na cabeça do menino. Aquilo ali não era um assaltante nunca na vida. Branquíssima, lavadinha, devia ter cheirinho de amaciante, cuidadosamente passadinha por mamã. O garoto devia ter até talco e hipoglós no meio das pernas. Dica para o assaltantezinho de araque: tente parecer mais perigoso, menos filhotinho indefeso. Como já disse, fui assaltada duas vezes, sou expert no assunto, e aparência conta muito, nesta hora.